ARTIGO | A democracia em xeque e uma nova fase da exploração
José Alex R. Soares (*)
Há um ataque orquestrado contra a democracia brasileira, um ataque que visa desestabilizar as instituições de Estado no país. O mais dramático desse movimento é a longevidade desse processo de desestabilização, que vem sendo desenhada desde o golpe contra a Ex-presidente Dilma. Esse momento é o ápice desse movimento.
A tentativa de assalto ao processo democrático é moldada por um método tradicional que visa desestabilizar as instituições – desacreditar a educação pública de qualidade, a saúde pública através do SUS, a ciência, a constituição de 1988, desacreditar a história do país. Esse método de ação se baseia na MENTIRA e na violência política. Essas são as principais armas do governo.
Nesse sentido, um Governo que estrutura seu mandato na política da MENTIRA tem como objetivo final perpetuar-se no poder, construindo um sistema de castas que funciona apenas sob a órbita da destruição das instituições democráticas.
O esgarçamento do tecido social provocado pelo atual governo, e consequentemente do caos político, gera uma crise permanente de credibilidade das instituições. O governo aposta em grupos de poder paralelo ao Estado, na constituição de grupos armados paramilitares, de forma semelhante a outros países da América Latina que passaram por essa situação. O discurso da violência e do ódio é sistemático, uma intimidação adicionando força bruta de grupos de milícias políticas.
Contudo, não podemos nos enganar. O projeto autoritário não se restringe a consolidação de um núcleo familiar no poder, mas representa o ápice do projeto neoliberal de expropriação[1]. O projeto político autoritário é súmula vinculante de um projeto de expropriação do seu povo. A expropriação neoliberal só pode viabilizar pela mão do autoritarismo (via o caso chileno do Pinochet). A desintegração do tecido social e a constituição de uma ordem distópica paramilitar funcionam como instrumento de expropriação econômica e legitimação do caos econômico enquanto ordem reinante. Esta é uma lógica que retroalimenta poder e acumulação de capital enquanto naturalização do mal.
Denunciar seus atos e suas manobras é uma forma de dizermos de forma clara e alta que não aceitamos uma manobra golpista não apenas contra o processo eleitoral, mas contra um aprofundamento da espoliação do povo em nome da acumulação infinita. O silêncio não pode prevalecer nesse momento. As denúncias são mais que um ato de coragem, são um ato de resistência e de negação à desconstrução democrática, que pese suas lacunas.
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[1] Aqui nos valemos da dupla conceitual exploração-expropriação, como trabalhado por Nanci Fraser e Rahel Jaeggi (2020). Lançando mão de suas palavras “Expropriação é acumulação por outros meios. Enquanto a exploração transfere valor para o capital sob o disfarce da livre troca contratual, a expropriação dispensa todas essas sutilezas em favor de um bruto confisco- do trabalho, sem dúvidas, mas também de terra, animais, ferramentas, minerais e depósitos de energia, bem como de seres humanos, suas capacidades sexuais e reprodutivas e seus órgãos corporais. As duas ‘ex’ são igualmente indispensáveis à acumulação de capital, e a primeira depende da segunda, de modo que não se pode ter exploração sem expropriação” (Fraser e Jaegger, 2020, p. 58).
José Alex R. Soares – Economista, pós-doutor pela FEA/USP, doutor pelo Prolam USP e professor de Economia do CEA na PUC-Campinas
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